Em 25 de novembro de 1960, na República Dominicana, o cruel ditador Rafael Leonidas Trujillo ordenou um ato de violência que marcaria seu nome na história. Julgando que acabaria com um problema causado por três mulheres que atrapalhavam seu planejamento autoritário e sangrento à dignidade do País, ordenou que elas fossem executadas, porém, enganou-se quanto à consequência de tal ato.
As vítimas, Patria Mercedes Maribal, Minerva Argentina Maribal e Antonia Maria Teresa Maribal, eram conhecidas na sociedade como Las Mariposas, líderes de um grupo que percebeu o estrago econômico-social provocado pelo ditador e lutou até a morte pela defesa os direitos que se perdiam submergidos ao sangue derramado pelo abuso do poder.
A morte das irmãs, ao invés de abrir caminho ao ditador, despertou no povo o mesmo sentimento de combatividade pela devolução da liberdade e dignidade social, até que, seis meses depois, o ditador foi assassinado.
Em homenagem às Las Mariposas é que se comemora hoje, 25 de Novembro, o Dia Internacional da Não Violência contra mulher, e que a equipe do Atualidades do Direito lança a campanha “Não violência contra a Mulher” para divulgar a importância da data, não só com pensamentos, mas com atos eficazes no combate à essa patologia social.
Estatísticas revelam a exacerbação em termos globais da violência contra a mulher, atingindo países dos mais aos menos desenvolvidos, e todas as classes sociais indistintamente. Desde onde a mulher cobre a face com os panos do costume oriental, até aqui, onde se vê as marcas deixas pelo homem rico e pelo pobre, que quer parecer superior.
A globalização da violência eleva a problemática ao status de preocupação internacional, refletido em importantes documentos como a Convenção sobre a eliminação de todas as formas de discriminação contra a mulher e a Convenção interamericana para prevenir, punir e erradicar a violência contra a mulher.
No Brasil, de acordo com pesquisa realizada pelo DataSenado em 2011, ciúmes e alcoolismo ainda assumem a liderança das maiores causas das agressões em âmbito doméstico, assim como o medo continua sendo a principal razão para a não efetivação do registro da ocorrência, seguido pela preocupação com a criação dos filhos, pela vergonha da violência sofrida, por achar que foi a última vez, e, por ultimo, pela dependência financeira.
Recentemente, o Supremo Tribunal Federal, reagiu coerentemente às estatísticas e solidificou entendimento referente à ação penal no crime de lesão corporal de natureza leve contra a mulher nos casos da Lei 11.340/06 (Maria da Penha), considerando que, nesses casos, a ação penal é pública incondicionada.
A atuação das instâncias formais de controle, com o apoio de toda a sociedade, deve ser imediato e incondicionado. Não estava coerente esperar que uma mulher, que já estava vulnerabilizada física e emocionalmente pela agressão, desse o primeiro passo para a responsabilização do acusado.
Já se reconhece estatisticamente que o temor à novas agressões impede as mulheres de buscar ajuda, assim como deve ser reconhecido também, que a maioria das agressões têm gravidade progressiva, iniciam-se na forma de lesão leve, passam à ser graves na reincidência, até que se chega à morte. Como já afirmamos em outras oportunidades: “formalidades demais podem matá-la”.
A Secretaria de Políticas para as Mulheres desenvolveu a Rede de enfrentamento à Violência contra a mulher, como uma “atuação articulada entre as instituições/serviços governamentais, não-governamentais e a comunidade, visando ao desenvolvimento de estratégias efetivas de prevenção; e de políticas que garantam o empoderamento das mulheres e seus direitos humanos, a responsabilização dos agressores e a assistência qualificada às mulheres em situação de violência”
Quando se fala em estratégias efetivas, significa que os movimentos não devem se restringir às homenagens, cartazes e faixas contra a violência, mas um trabalho de conscientização de que as agressões, não apenas físicas, mas também a psicológica, a sexual, a patrimonial e a moral, devem ser evitadas. O exercício deve ser de antecipação, e não apenas de repressão.
Muito já se avançou no sentido da proteção da mulher, principalmente após a entrada em vigor da lei Maria da Penha e a sua melhor interpretação pacificada pelo STF. Apesar de que, hoje, no conjunto de propostas que compõem o Projeto de Lei do Senado nº 156/09 para reformar o Código Penal, identifica-se uma proposta que consideramos absoluto retrocesso legislativo.
Pretende-se substituir a pena de prisão por medidas alternativas no crime de lesão corporal e a eliminação do § 9º do Art. 129 do CP que foi inserido pela lei 11.340/06. Ou seja, será revogado da Lei Maria da Penha, o artigo 41 que existe especificamente para afastar as benesses da Lei do juizado especial nº 9.099/95. Conclusão: A lesão corporal contra mulher em âmbito familiar será transformada em crime de menor potencial ofensivo.
Não estamos assumindo papel de gestores atípicos da moralidade, muito menos pregando pelo encrudescimento desregulado da legislação penal, mas pela sensibilidade com os direitos que já foram conquistados com o suor e sangue de muitas vítimas.
O direito penal segue como ultima ratio, mas a estatística do feminicídio no Brasil comprova que na proteção da mulher o Estado não pode negligenciar. Quantas irmãs maribal precisarão morrer para que se tome consciência disso? Deve-se, portanto, prosseguir com as avalições da política criminal de combate à violência, não só nesta semana de passagem da data histórica, mas durante todo o ano, a fim de se dar uma eficácia equilibrada à legislação que está em vigor e reduzir a possibilidade de erros na tentativa de melhoria.
Compartilhe: